sábado, 11 de agosto de 2012

Novos Anticoagulantes: abordagem do paciente em uso de dabigatran na vigência de sangramento ou no período perioperatório.


Novos Anticoagulantes: abordagem do paciente em uso de dabigatran na vigência de sangramento ou no período perioperatório.

Com a chegada dos novos anticoagulantes, em breve iremos nos deparar com suas complicações (notadamente sangramento) e com o seu manuseio frente a indicação de procedimentos cirúrgicos.

Abaixo, os nomes comerciais, posologias recomendadas e apresentações farmacêuticas disponíveis no Brasil.



Surge a questão: como manusear estas drogas nestas situações.


Dabigatran

 Deve ser suspenso pelo menos 24h antes do procedimento eletivo, a depender da função renal. Na tabela abaixo, a recomendação da literatura para suspensão conforme a função renal.

Função Renal
(Clearance Cr)
Meia-vida (horas)
Tempo de descontinuação após ultima dose de dabigatran antes da cirurgia


Risco baixo de sangramento perioperatório
Alto risco de sangramento perioperatório
> 80
13 (11 – 22)
24 horas
2 – 4 dias
> 60 e ≤ 80
15 (12 – 34)
24 horas
2 – 4 dias
  > 30 e ≤ 50
18 (13 – 23)
Pelo menos 2 dias
4 dias
≤ 30
27 (22 – 35)
2 a 5 dias
> 5 dias

Nota: São consideradas cirurgias de alto risco de sangramento as cirurgias cardíaca, abdominal ou envolvendo um órgão nobre, neurocirurgia, raquianestesia. São considerados de maior risco de sangramento os idosos, portadores de cardiopatia, nefropatia ou doença respiratória graves, pacientes que fazem uso de outro antiplaquetário.

Fonte:  van Ryn et al. Effect of dabigatran on coagulation assays and reversal strategies. Thrombosis and Haemostasis.03.6/2010. http://wiki.med.uottawa.ca/download/attachments/9764866/dabigatran-review.pdf?version=1&modificationDate=1310004752000


Nos procedimentos de urgência, devemos ter o suporte de um hematologista, reserva sanguínea e planejamento cirúrgico para abordagem através de técnicas menos invasivas e com menor risco de sangramento. Abaixo as recomendações para este tipo de procedimento.

 Recomendações:

• Parar o dabigatran.

• Verificar hemograma completo, eletrólitos (incluindo cálcio), função renal e  coagulação, incluindo  TTPa, TT e fibrinogênio. Se algum destes alterado, considerar adiar a cirurgia, se possível, até normalização ou até que tenha decorrido tempo suficiente para a liberação da droga.

• Quando a cirurgia for  urgente, consulte Serviço de Hematologia sobre medidas (fator VIIa recombinante, por exemplo) para controlar a hemorragia, se ocorrer, antes ou durante a cirurgia.

• O reinício do dabigatran após a cirurgia será determinado pela natureza da cirurgia, da urgência em reiniciar tromboprofilaxia (risco de evento tromboembólico) e do estado hemostático do paciente. Discussão com um hematologista é apropriado para determinar gestão de casos individuais.

Em situações onde o risco de sangramento é pequeno, é sugerido que dabigatran seja  reiniciado com uma única cápsula (75 mg, 110 mg ou 150 mg, dependendo da indicação) 1-4 horas após a cirurgia com a dose de início no dia seguinte ao procedimento cirúrgico. Dose normal após 3º dia de pós-operatório.

Rivaroxaban.

Na tabela abaixo as recomendações quanto ao manuseio do rivaroxaban no período perioperatório.
 
Tempo da última dose de rivaroxaban antes do procedimento
Risco padrão de sangramento
Alto risco de sangramento (grande cirurgia punção espinhal ou colocação de espinal / epidural do cateter, e outras situações em que a hemostasia completa pode ser exigido)
24 h
24-48 h

 Apesar da monitorização terapêutica não ser recomendada através de testes de coagulação de rotina, em certas situações clínicas em que a ausência de efeito anticoagulante induzida por rivaroxaban precisa ser assegurada, pode-se dosar o tempo de protrombina (TP) e tempo de tromboplastina parcial (TTPa) e devem ser normais. Isto é importante:

• para garantir apropriada eliminação do rivaroxaban antes de procedimentos invasivos

• para garantir eliminação do rivaroxaban antes da terapêutica trombolítica aguda do AVC isquêmico

 NOTA: não há correlação segura entre TP elevada / TTPa e efeito terapêutico.
(Hillarp A et al. Efeitos do fator Xa oral directa inibidor rivaroxaban em ensaios de coagulação comumente usados. J Thromb Haemost 2011; 9:133-9).


Em caso de tomados os cuidados acima, porém paciente apresenta sangramento anormal ou chegando à emergência paciente com sangramento como complicação do uso de um dos novos anticoagulantes, as orientações são as seguintes:

Não há NENHUM agente de reversão ou antídoto para nenhuma das duas drogas.

Dados muito limitadas, essencialmente não-humanos, estão disponíveis para orientar o manejo de hemorragia.

Sangramento leve
• adiar a próxima dose ou interromper o tratamento


Moderada a grave hemorragia
• tratamento sintomático

• compressão mecânica

• intervenção cirúrgica

• reposição de líquidos e suporte hemodinâmico

• Transfusão de sangue produto • carvão oral (se rivaroxaban administrado há menos de 2 horas)

 NOTA: Não é dialisável

Sangramento ameaçador à vida
 • Medidas acima

• Carvão ativado

• Último recurso: PCC – Bebulin (Concentrado de Fator IX, Famp 600U) na dose de 25-50 U / kg



Referências:

1.    New Zeland Government. PHARMAC (Pharmaceutical Management Agency) Guidelines for testing and perioperative management of dabigatran - for possible inclusion into local management protocols.



3.    van Ryn et al. Effect of dabigatran on coagulation assays and reversal strategies. Thrombosis and Haemostasis.03.6/2010. http://wiki.med.uottawa.ca/download/attachments/9764866/dabigatran-review.pdf?version=1&modificationDate=1310004752000


Até a próxima postagem.

Aguardo comentários.



Marcia Cristina

5 comentários:

  1. Parabéns pelo tópico, Dra Marcia, pois com o advento recente desses novos anticoagulantes, a literatura ainda deixa a desejar quanto às medidas a serem tomadas em um quadro de hemorragia na vigência do uso de tais drogas. Só gostaria de saber se ambos não são dialisáveis ou apenas o rivaroxaban? Abraços
    Cleobenysson Cruz

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  2. Obrigada Cleobenyssom! Ambos não são dilapidáveis!

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  3. Ótima postagem Dra Marcia! Parabéns! Uma dúvida... O concentrado de fator IX é feito em dose única ou pode ser repetido ( nos casos de sagramento grave com rivaroxaban) ? Deborah Costa.

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  4. Boa Tarde e obrigada pelas informações.
    Gostaria de saber no caso de paciente com FA crônica submetida à cirugia de transplante de córnea, quando deve ser reintroduzido o rivaroxaban no pós operatório. Grata.

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  5. Olá Doutora Marcia Cristina: Sua postagem aborda importante assunto ainda pouco difundido na literatura médica. In casu, em cirurgias eletivas com risco de sangramento, não há dúvida da necessidade de suspensão do uso dos novos anticoagulantes, naquelas particularidades e prazos assinalados em seu excelente estudo.
    Contudo, persiste a dúvida: Estando o paciente, exemplo: portador de FA crônica, sem anticoagulação por mais de 24 horas, qual o risco provável de tromboembolismo arterial, tanto no pré quanto no pós operatório? Leve-se em conta que durante o procedimento cirúrgico com anestesia geral a possibilidade de fenômeno embólico em átrio esquerdo é bem maior. Qual o risco de uso da heparina fracionada durante a cirurgia? Gostaria de seus abalizados esclarecimentos destas dúvidas. Grato Edmundo Santiago.

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