Blog destinado à discussão de casos clínicos em cardiologia, baseada nas atuais diretrizes e guidelines em cardiologia, bem como interpretação de ECGs de forma prática e objetiva, sempre baseada em casos reais. O objetivo é a Boa Prática Médica em Cardiologia, através de condutas baseadas em evidências e fundamentadas no cuidado e preocupação com o paciente como um todo. Marcia Cristina (organizadora do Blog).
terça-feira, 20 de março de 2012
domingo, 18 de março de 2012
Estatinas causam diabetes?
O conceito de prevenção primária e secundária de eventos cardio e cerebrovasculares com estatina é um dos mais recentes paradigmas da prática médica. Inúmeros são os estudos clínicos randomizados que demonstram a sua eficácia na prevenção de eventos cardio e cerebrovasculares.
Contudo, recentemente o FDA têm feito alertas sobre a associação entre NOVOS CASOS DE DIABETES em USUÁRIOS DE ESTATINAS, a partir de ESTUDOS e METANALISES anunciando a associação. Vejamos alguns achados:
1. TNT (Treating to New Targets) trial, 351 dos 3798 pacientes randomizados para 80 mg de atorvastatina e 308 dos 3797 randomizedos para 10 mg desenvolveram diabetes mellitus (DM) (9.24% vs 8.11%, hazard ratio ajustado [HR]: 1.10, 95% IC: 0.94-1.29, P = .226).
- No IDEAL (Incremental Decrease in End Points Through Aggressive Lipid Lowering) trial, 239 dos 3737 pacientes randomizados para atorvastatina 80 mg/d e 208 dos 3724 pacientes randomizados para simvastatina 20 mg/d desenvolveram DM (6.40% vs 5.59%, HR ajustado: 1.19, 95% IC: 0.98-1.43, P = .072).
- No SPARCL (Stroke Prevention by Aggressive Reduction in Cholesterol Levels) trial, DM foi encontrada em 166 dos 1905 pacientes randomizados para atorvastatin 80 mg/d e em 115 dos 1898 pacientes no grupo placebo (8.71% vs 6.06%, HR ajustado: 1.37, 95% IC: 1.08-1.75, P = .011).
Nos 3 trials, glicemia de jejum, IMC, HAS e triglicerídeos foram os maiores preditores independentes de DM, mas NÃO USO DE ESTATINAS. Além disso, não houve diferença na taxa de eventos cardiovasculares maiores que foi 11.3% em pacientes que desenvolveram DM e 10.8% naqueles que não desenvolveram DM (HR ajustado: 1.02, 95% CI: 0.77-1.35, P = .69). No total, 1449 pacientes tratados com altas-dose de estatina desenvolveram diabetes comparados a 1300 pacientes usando doses moderadas. Isto implicou em dois casos adicionais de diabetes mellitus por 1000 pacientes-ano, resultando em um odds ratio para diabetes de 1.12 (95% IC 1.04-1.22). Por outro lado, o beneficio do uso de estatina se manteve, com 6.5 menos eventos cardiovasculares por 1000 pacientes-ano no grupo de altas doses de estatina, implicando em uma redução relativa de 16%. Logo, o BENEFÍCIO SUPERA O RISCO, se é QUE ELE EXISTE REALMENTE.
Em meta-analise de 13 trials clínicos randomizados com estatina, que incluiu 91,140 participantes sem DM, Sattar et al analisou a associação. Encontrou 4278 novos casos de diabetes em um seguimento médio de 4 anos. Embora tenha havido grande variação na incidência de DM nos vários trials, nos dados combinados houve 174 mais casos de DM no grupo em tratamento com estatina do que no grupo placebo, representando um acréscimo de 9% na probabilidade de desenvolver DM durante o seguimento. Isto significa 1 caso adicional de DM por 255 pacientes tratados com estatinas em 4 anos.
Em resumo:
Meta-analises e estudos observacionais não podem estabelecer RELAÇÃO CAUSAL, PORQUE ELES NÃO PODEM CONTROLAR OU AJUSTAR PARA FATORES DE CONFUSÃO NÃO MENSURADOS E PARA A DIVERSIDADE DE INFLUENCIAS NÃO ANALISADAS. E PRINCIPALMENTE, NÃO FORAM DESENHADOS PARA TESTAR A HIPÓTESE DE QUE ESTATINA AUMENTA O RISCO DE DIABETES. Assim, apenas podem SUGERIR UMA ASSOCIAÇÃO.
Portanto, não deveriam ser usados como MODIFICADORES DE NOSSAS CONDUTAS na PRÁTICA, até que estudos definitivos CONFIRMEM A RELAÇÃO CAUSAL, VISTOS AS EVIDENCIAS DOS BENEFÍCIOS ESTAREM BEM ESTABELECIDAS.
Finalmente, não é mais recomendado pelo mesmo FDA realizar dosagens seriadas de enzimas hepáticas no acompanhamento dos pacientes em uso de estatina, apenas antes de iniciar o tratamento e conforme indicação clínica (hiperbilirrubinemia e/ou icterícia clínica) por ser esta complicação imprevisível e muito rara. Nestes casos, suspender a estatina e não reiniciar se outra causa não for encontrada. Recomenda ainda atenção com o uso em associação com inibidores da protease pelo risco elevado de miotoxidade, sendo contraindicadas sinvastatina e lovastatina. Abaixo as recomendações das doses de estatinas em portadores de HIV em uso de inidores de protease.
Estatina
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Interação com inhibidor(es) de protease
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Recomendações
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Atorvastatina
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Evitar atorvastatina
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Usar com cuidado a menor dose possível
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Não exceder 20 mg/dia
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Não exceder 40mg/dia
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Fluvastatina
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Nenhum dado disponível
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Lovastatina
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Contraindicada
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Pravastatina
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Nenhuma limitação na dose
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Rosuvastatina
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Limitar a 10 mg dia
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Simvastatina
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Contraindicada
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Até a próxima postagem.
Aguardo comentários.
Márcia Cristina
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